UIR

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UIR 




Disse-me:

— Ele é um Uir.

— É o quê? — eu não havia entendido.

— Uir!

— Uir?

— É. Uir.

— E o que é um Uir?

— O senhor não sabe o que é um Uir? — ele pareceu surpreso.

— Não, não sei. O que é?

— Uir é um homem.

— Só isso?

— É.

— É um homem comum?

— É.

— E por que eu iria querer a ajuda de um homem comum?

— Porque um Uir ajuda os outros homens a criar.

— Ajuda?

— É. Ajuda.

— Como ele faz isso? — eu comecei a me irritar com as respostas.

— Sei não.

— Não sabe?

— É. Sei não, senhor.

— E como você sabe que um Uir ajuda um homem a criar?

— Todo mundo sabe isso. Só o senhor é que não sabe.

— Todo mundo sabe?

— É. Só o senhor é que não sabe.

— Eu sei. Você já falou isso.


O rapaz ficou calado. Naquele dia, lembro-me de ter pensando em como alguém era capaz de dizer tão pouco em tanta conversa. Hoje, entendo que ele me disse muito, muitíssimo, com poucas palavras.


Continuei:

— E onde ele fica?

— Em Diamante.

— E onde fica Diamante?

— É lá pro meio sertão. Da Paraíba.

— É longe? — porque ele falava como se fosse longe.

— É.

— O quão longe?

— De carro?

— Isso, de carro.

— Umas sete horas.

— E como eu faço para chegar lá?

— Sei não.

— Não sabe?

— Sei não, senhor.

— Você conhece alguém que saiba?

— Também não.

— Ninguém?

— Por que o senhor não pergunta pros artistas? Eles sabem.

— Que artistas?

— Todos. Os daqui. Os de João Pessoa. — eu estava em João Pessoa.

— Todos sabem?

— Sabem.

— Só eu é que não... — brinquei, em voz baixa, comigo mesmo.


Todos sabiam.

Músicos, escritores, pintores, intelectuais.

Todos sabiam do Uir que vivia em Diamante.

Varei o sertão.

Varei para encontrá-lo.

Pela estrada, nas cidades, sabiam do Uir.

Em Diamante, perguntei por ele.

O Uir estava lá, mais adiante.

Só eu não sabia.

A morada do Uir era grande, clara, portas e janelas.

O vento corria por dentro.

O Uir tinha nome.

Adam.

Adam tinha pés bonitos, descalços.

Pernas grossas, duras.

Vestia um calção curto, novo.

Peito e costas queimados, pelo sol.

As mãos amenas, os braços.

Longos, lisos, loiros, os cabelos brincavam com toda luz.

O Uir era um homem comum.

Os olhos de Adam brilhavam amarelos.

Muitos homens possuem olhos amarelos.

Adam falava lentamente e cozinhava.

Recebia muitas visitas, os artistas.

Conversava sobre tudo.

Suava pouco, mesmo no calor.

Ofereceu o almoço, o suco e o doce.

Comi.

Fiquei por lá, depois voltei.

Inspirei-me, o Uir ajuda um homem a criar.

Voltei a Adam.

Voltei a Adam mais de uma vez.

Adam era mesmo um Uir, ajudava-me a criar.

Os nomes eram os mesmos.

Maçã chamava maçã.

Mentira chamava mentira.

Mulher chamava mulher.

Maldição chamava maldição.

Milagre chamava milagre.

Mas quando Adam dizia os nomes, ajudava qualquer homem a criar.

Busquei Adam contadas vezes.

Pernas de homem.

Músculos de homem.

Boca e palavra de homem.

Também encontrei.

Encontrei corpos de homem que me ajudaram a criar.

Os olhos amarelos, de Adam, me ajudaram a criar.

Os olhos amarelos, de homem, me ajudaram a criar.

De homem, de homem o mundo se encanta.

De Adam, o mundo se encanta.

Do Uir, o mundo se encanta.

Basta olhar para ele.

Estar com ele já basta.

O Uir mostra o caminho a seguir.









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