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ALÍVIO
Aldo já suspeitava da incomensurabilidade da liberdade desde a infância. O que aprendeu tardiamente foi que os alívios são negociáveis. A altos preços, geralmente.
Há oito meses transara com um rapaz de 19 anos. Uma semana depois, o início do tormento. O assédio seguiu caminhos óbvios, que, se observados friamente, com a imparcialidade dos práticos, poderia até ganhar elogios sóbrios.
As insistentes ligações pediam sexo. O pedido era razoável, a não ser pela impossibilidade de negá-lo.
“Se não fizer o que eu quero, digo a todos que você é gay!”
E Aldo fazia, primeiro com desconfiança, ainda tentando decifrar o rapaz. E embora logo tenha entendido que a bola de neve só corre para baixo, continuou cedendo às vontades e caprichos do outro.
“Preciso de dinheiro.” E depois: “Quero dinheiro!”
“Vamos nos encontrar.” E logo: “Estou indo aí!”
E foram meses de avanços indefensáveis, batendo em retirada sempre. Aldo perdeu sono e dinheiro por conta da foda mal escolhida.
Ligou para o pai, o irmão e a irmã. No almoço de domingo, disse a eles que era gay. Contou aos primos, a alguns colegas mais próximos. Em questão de dias, a vizinhança já tinha seu parecer sobre a sexualidade escondida de Aldo. Em outro pouco tempo, ele já respondia à curiosidade dos recém-avisados nas festas e no trabalho.
A chantagem acabou. Sem gosto de vingança, o que teria dado a Aldo um antídoto para amenizar a descoberta de sua fragilidade. Contudo, o aperto passara: tirara o sapato, matara a fome, mijara, achara a coberta, recebera o telefonema, desengasgara, a chave aparecera, o remédio fizera efeito, vomitara, dissera.
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