NOME

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NOME


Quando entrei em meu quarto, meu filho de 6 anos tinha tirado todo o uniforme da escola e se olhava no espelho.

— O que é isso, meu filho?
— Eu estou pensando em um bom lugar para escrever meu nome.
— Como assim?
— Eu acho muito estranho não ter meu nome escrito em mim...
— Mas você conhece alguém que tenha?
— Não. Gente, não. Mas carro tem, prédio tem, roupa tem, brinquedo tem, remédio tem. Até algumas comidas têm.
— É verdade.
— E se eu esquecer quem eu sou, se eu ficar igual gente que perde a memória? Como é que vão saber quem eu sou?
— É. Acho que você tem razão. Melhor escrever seu nome em você...
— Onde você acha que é um bom lugar?
— Perto do umbigo.
— Por que “perto do umbigo”?
— Porque fica escondido, mas a gente pode ver na hora que quiser.
— Gostei. Então escreve aqui pra mim, com a canetinha azul escura.

Eu escrevi, circunscrevendo seu umbigo na letra “o”, com acento.

— Ficou invertido! Olha, mãe! No espelho! Ficou ao contrário!
— Eu sei, meu filho.
— Agora se eu me perder não tem problema! É só olhar na minha barriga e ver quem eu sou!
— É verdade.

Ele colocou o uniforme novamente, satisfeito.

Enquanto almoçava e durante o percurso até o colégio, não parou de levantar a camisa para reconhecer as letras que formavam seu nome, agora de cima para baixo. Nos dias que se seguiram, após o banho, ele pedia que eu reforçasse o escrito.

Não adiantou.

Meu filho logo afrouxou a vigilância com o nome e parou de conferir o que trazia ao umbigo. Depois, esqueceu-se também dessa história ou escondeu-a em um recôndito imperscrutável. Agora está perdido e não sabe quem é. Às vezes aparece invertido, mas não consegue se ler.

Teófilo.

Já li que significa “aquele a quem Deus ama” ou “o amigo de Deus”. A qualquer hora do dia ou da noite, quando meu pensamento se deixa atar pela saudade, eu faço uma oração por ele; para que se lembre, para que se ache, para que esteja bem.





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