DIÁRIO DO PENSAMENTO LASCIVO

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DIÁRIO DO PENSAMENTO LASCIVO


Antes de acordar, eu sonhava estar em um observatório astronômico em meio ao deserto. Sem perceber meu próprio lapso de atenção, surpreendo-me com a aproximação de um colega de trabalho — suponho — que sobe por uma escada de metal até onde estou. Veste apenas calças, está com dorso e pés à mostra. Ele para atrás de minha cadeira e me faz um carinho na nuca; pela abertura da gola de minha camisa, sua mão me acaricia o peito. Deixa-me, vai até o balcão do observatório e assenta-se no chão, pernas entre as grades, pendendo no ar. Sigo-o, sento-me por detrás e coloco minhas pernas por cima das suas, também vazando o espaço. Pressiono meu peito em suas costas, prenso-o suavemente contra a grade. Seu corpo está tão quente, e eu tão excitado, que sinto o gozo. Acordo, estou mesmo melado.

Levanto-me antes das sete, o que não é de costume. O banho do meu corpo é lento. Enquanto tomo o iogurte, penso que o outro homem no observatório do sonho pode ser um dos meus reais colegas de trabalho no escritório, talvez o André; eu cederia anos de minha vida para ter o prazer de colocar meu peito em suas costas.

No espelho, acerto a gravata rosa e grená, a preferida do atendente da locadora que arrasta uma asa para mim. Depois do trabalho, vou entregar o filme e tenho certeza de que vai me elogiar a elegância. Deve me desejar como eu desejo o André, colocar o peito em minhas costas.

O dia não está tão quente, mas não resisto a ligar o ar condicionado do carro. Protegido, de dentro de minha cápsula, procuro homens pelas ruas. Anos de lascívia bem orientada me fazem encontrar desejos a toda parte. Fico excitado, completamente duro durante quase todo o trajeto até o trabalho. São ombros redondos, orelhas grossas, antebraços fortes, pernas. E o que dizer das bocas?

Na garagem do edifício, um dos porteiros me entrega o novo cartão para os mensalistas. Ele certamente não faz ideia de que a simples visão de sua mão ateia fogo em minhas fantasias. Deve ter o pau grande, sempre reparo o volume da calça. Já me enganei muitas vezes, mas alimento esperanças de encontrar brinquedos cada vez maiores.

Minha secretária traz mais processos do que eu gostaria de ter sobre a mesa. Almoço preocupado com o contrato de um cliente. Ouço dizerem que estou no mundo da lua, e eu fico chateado de estar desatento aos meus colegas por causa do tal contrato. Já me certifiquei várias vezes, geralmente o faço quando estamos todos juntos, ou almoçando, ou em reunião: tenho tesão em todos os homens do escritório. São onze, e qualquer um deles, com um aceno, teria um escravo. Mas isso não é o mais excitante. O que confirma a minha sina abençoada é que todos — todos! — têm bundas que chegam a violentar minha privacidade, tamanho o magnetismo que têm sobre meu pau. Recentemente, no churrasco de aniversário do chefe, descobri as coxas. Louvados sejam!

Gilberto me pede ajuda com uma ação indenizatória; largo meus contratos e vou dar uma olhada. Enrolamo-nos em várias discussões e, em exaustão, Gilberto se larga na cadeira, fecha os olhos e joga a cabeça para trás. Tenho vontade de avançar sobre ele, que merece recompensa por se esforçar tanto.

De saída, André me chama. Está com as mãos molhadas, pede que eu dobre os punhos de suas mangas. Dobro. Ele agradece. Eu já o vi sem camisa, lembro, e reconheço seus mamilos pela sombra sob o tecido branco.

A volta para casa é como a ida: estão no ponto de ônibus, nas bicicletas, nas filas das lotéricas, em frente à venda, na calçada, no carro ao lado. Há homens por toda parte, sorte minha! Qual deles poderei ter?

O rapaz da locadora tem sempre cantadas sutis, o que tem um fascínio a mais do que a pura sensualidade. Já decidi que um dia o levo para casa. Hoje fico apenas com um filme de ação. O ator na tela basta para que eu recupere, das entranhas do meu desejo, os anos que já prometi dar ao cosmos caso ele me conceda benefícios de ordem sexual.

Masturbo-me antes de ler o best-seller. Adoro gozar duas vezes no mesmo dia. Paro várias vezes a leitura: são homens que lancetam meu imaginário.

Tomara que eu sonhe gostoso esta noite.





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2 comentários:

  1. Uli(terato primus) querido,
    Como mistura bem visualidade e sensações...
    Coragem e desejo,
    crudeza,instinto, audácia
    e quão encantadoramente sedutor
    se transformou seu texto!
    beijos, flores e parabéns

    PS:posso divulgar o link do Homo para quem gosta de apreciar boa arte?

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  2. O limite entre o erótico e o chulo é tênue.
    Você se mantém sobre a linha, num equilíbrio invejável e sagaz.

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