PRECONCEITO

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PRECONCEITO


Acabara de conhecer Hassan. No entanto, Imad já se sentia à vontade para inocular seu discurso. Bem articuladamente, Imad explicava as raízes históricas do preconceito contra os homossexuais. Citava exemplos para ratificar formulações teóricas e lembrava – e inventava – algumas situações pela qual ele mesmo havia passado, a fim de legitimar um enlaçado de observações a respeito do medo, do poder e da ignorância. Bastante praguejava contra a ignorância. 

Hassan concordava com ele, em quase tudo, e, quando solicitada sua concordância, dava-a sem pestanejar. Ouviu por mais de uma hora o protesto e também a ira de Imad, que de algum modo sabia que aquele tipo de desabafo contra o mundo tinha poderosos efeitos terapêuticos. Naquela noite, em especial, mesmo com a benesse do expurgo de tantas indignações, Imad não conseguia se sentir bem, nem mesmo um pouco, e foi impossível para ele parar de falar. Hassan o ouvia, agora com outro tom, mais melancólico e descrente, dizer palavras como envergonhado, discriminado, amargor e leviandade. Repetia as mesmas ideias de antes, mas acrescentava-se, murmurando: angústia, ressentimento, covardias, insensibilidades. E além dessas tantas, com as devidas pausas, falava em vômito, em vomitar, no nojo que sentia da hipocrisia. 

Por alguns instantes, em uma das paradas para tomar fôlego, Hassan achou que Imad fosse realmente vomitar no meio do bar, mas ele se conteve. Hassan convidou-o para saírem dali, tomarem um ar fresco, uma dessas conversas. Imad negou imediatamente, pagou a conta e partiu. 

A essa hora, o local já estava vazio, mas a saída de Imad, ao contrário do esperado, deixou o lugar mais cheio de vida. Hassan pensou isso. 

Hassan ponderou sobre ir atrás de Imad para dizer-lhe um bom pensamento que havia lhe ocorrido. Ocorrera-lhe que Imad era um abençoado, pois embora soubesse de tanto preconceito contra si próprio, era, ao mesmo tempo, incapaz de ter a dimensão do quanto era odiado. Provavelmente, ou melhor, certamente, nunca saberia dos empregos que perdeu, das piadas que lhe zombaram pelas costas, da inutilidade dos esforços feitos para se safar de ser excluído. Não lhe chegariam aos ouvidos as palavras mordazes de amigos e inimigos. Agora, para onde quer que estivesse indo, não levaria consigo outras infinitas injúrias e deslealdades das quais fora inadvertida vítima, das quais milhares de homossexuais são vítimas, a cada minuto, cada minuto. Essa ignorância era uma bênção, um justo decoro da vida para com os que por ela, ou por conta dela, eram tão injustiçados. 

Chegou a sair pela porta da frente, olhar em ambas as direções. Imad já havia se perdido pela cidade. Hassan achou melhor assim. Mais tarde, concluiu que, se tivesse chegado a compartilhar suas ideias com Imad, poderia ter prestado um desserviço, aumentando seu sofrimento. Ignorância é ignorância; não seria útil tomar conhecimento dela. Ou haveria ganho em mais uma desilusão?





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